O “vendedô” e o consultor
Eu causei algumas decepções para meus pais. Uma delas, lá por 1990, foi quando eu disse que iriar trabalhar como “vendedor”. Eles ficaram visivelmente abatidos. Minha mãe colocou a mão na cabeça e perguntou “a empresa está te punindo porque você fez algo errado?”. Meu pai veio com a frase típica “Meu filho, habib, você estudou tanto. Vai deixar tudo isto de lado para ser vendedor? Você vai jogar sua carreira no lixo!”
Fechem os olhos por um momento e pensem no que seria a figura típica de um vendedor. Eu mesmo acabo sempre imaginando aquele vendedor de carros usados em filmes americanos. Sabe o cara fumando charuto com a camisa aberta, cheio de correntes de ouro e falando mais do que a boca? Você tem certeza que o cara vai te enrolar e vai te enganar.
Vocês, com certeza, já ouviram falar que vendedor é o cara que consegue vender qualquer coisa para qualquer um. Vende gelo para esquimó. A frase que eu acho mais engraçada “Bom vendedor já nasce bom vendedor” – se assim fosse nós poderíamos recrutar vendedores lá na maternidade. Já pensou olhar para o bebezinho e falar “este sim, vai ser vendedor dos bons!”
Eu tinha um chefe que falava que o bom vendedor, que agora tem o nome de vendedor consultor, tem quer ser bem informado e atualizado, bom observador, bom ouvinte e bom comunicador, carismático, auto-motivado, proativo, sensato, flexível, criativo, assertivo, persistente, ter perspicácia, postura e ser um grande estrategista. Além disto, o vendedor deveria conhecer psicologia já que trabalha com pessoas, marketing para fazer geração de demanda, administração para conseguir gerir bem o seu tempo e falar de negócios com os clientes, e, obviamente conhecer muito bem os produtos que está vendendo e o mercado dos seus clientes. Então, basicamente, o vendedor tem que ser um SUPER HOMEM – sem usar a capinha vermelha para não ficar estranho…
Aqui vem a pergunta: Será que isto tudo é “ensinável”? Será que conseguimos criar um vendedor consultor?
A primeira preocupação é saber se o candidato tem alguma propensão, ou vocação, à vendas. É como fazer o teste de vocação profissional. Tem gente com vocação para ser médico, gente com vocação para ser advogado e gente com vocação para ser vendedor. Daria para transformar qualquer pessoa em médico? Até daria, mas seria um esforço impressionante do aluno e do professor e provavelmente o aluno não seria um expoente em sua área.
Para os que têm vocação para vendas, o mercado sempre fala da regra 80/20. Vinte por cento são vendedores intuitivos ou “natos” – conseguem ter sucesso, sem saber exatamente por que. Já vi muitos “natos” tentarem ensinar para os outros usando o processo “A gente vai ao cliente e você fica observando tudo o que eu faço. Na próxima vez você faz exatamente como eu fiz. Aí vai dar certo”. Obviamente que não dá certo porque esta não é a forma correta de transferir conhecimento.
Oitenta por cento dos candidatos a bons vendedores conseguem aprender SIM, mas com muito estudo, metodologia, ferramentas e “coaching” de alguém mais experiente e que consiga transferir o conhecimento de maneira estruturada.
O vendedor consultor está interessado em criar e estabelecer um relacionamento de longo prazo com seus clientes – assegurando-se que o cliente compre muitas vezes. O “vendedô” está interessado no dinheiro de curto prazo, na transação, o que pode não ser bom para a empresa. Mesmo aquele “vendedô” de carros usados de filmes americanos poderia estar interessado em criar uma rede de clientes, mas isto é perfil. Infelizmente 25% dos vendedores são assim – alguns tão refinados que a empresa tem dificuldades em identificar numa primeira olhada. Dá para mudar alguns destes “vendedôs” com coaching, processos, ferramentas e metodologia.